"A harmonia é a linha de conduta da qual toda ação humana deve proceder" - Confúcio
"A suavidade de todas as coisas anula a dureza de todas as coisas" - Lao Tzu

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Tai Chi - O Supremo

Quando falamos de Tai Chi qual é a impressão que temos? Para alguns pode soar como algo pouco significativo por ser um termo estranho. Para outros é algo totalmente desconhecido por nunca terem ouvido falar. Tai Chi é pouco difundido no Ocidente, até pelo fato deste lado do globo ter se desenvolvido de uma forma diferente do Oriente. Mas então, o que é Tai Chi? De onde ele vem? Quando surgiu? Para que serve? São perguntas simples, e se existem respostas curtas são apenas para representar uma dimensão sem fim de explicações, sugestões, descobrimentos e evolução do que realmente é e como se aplica na mente e nas ações humanas.

Na verdade Tai Chi deve ser visto, antes de tudo, na teoria como uma filosofia e na prática como um modo de vida.

Não se sabe ao certo quando o Tai Chi surgiu, e se formos desconsiderar o termo talvez seja tão antigo quanto o universo. O que se sabe é que é um modo de vida praticado pelos chineses por milhares de anos. E por todos estes milênios a filosofia Tai Chi sobreviveu e hoje ainda pode ser explicado e praticado, e seus efeitos são a prova viva nos mestres de que seus princípios originais continuam intactos se adaptando as gerações, talvez pelo motivo de não o terem levado como religião ou apenas linha filosófica, criando instituições bitoladas e dogmáticas. Provavelmente sua sobrevivência se dá pelo fato de em lugar disso, ter sido passado e protegido pelos praticantes como algo essencialmente prático, sem restrições e crenças de qualquer espécie.

Tai Chi pode ser definido como “O Supremo”. Desde sempre o ser humano esteve buscando formas de melhorar sua vida no aspecto mental e físico nas diversas áreas da vida, e assim a evolução se fez através da história. Essa busca incessante fez-se perceber e construir a idéia de que a mente humana não possui limites e que o corpo físico pode alcançar capacidades muito além do que comumente pensamos. E foi assim, há muitos milhares de anos, que surgiu esse pensamento que conhecemos como Tai Chi. Um modo filosófico e prático de viver para alcançar as maiores capacidades do ser humano e vencer as barreiras da mente, do corpo e da vida de uma forma harmônica e natural.

Assim vemos que o Tai Chi existia mesmo antes de nascerem as Artes Marciais, pois ele era cultivado pelos chineses nas mais diversas áreas da culinária, da medicina, das artes, das relações humanas, das relações sociais, etc.. Isso porque Tai Chi se baseia na combinação de duas forças, o Yin e o Yang, o negativo e o positivo. Daí que surge a idéia de que Tai Chi, como princípio, pode ser tão antigo quanto o próprio universo. Yin e Yang são duas forças precisas para a manifestação das criações que vêm de dimensões mais sutis da natureza e do cosmos, e é o que mantém o equilíbrio de tudo. Assim percebemos com o dia e a noite, o quente e o frio, o seco e o molhado, o doce e o amargo, o movimento e o repouso. E os chineses acreditavam que harmonizando suas ações de acordo com esses princípios poderiam alcançar estados mais elevados do corpo e do espírito ao atingir uma vida qualificada e próspera. Não podiam conceber a dimensão total de que Tai Chi abrangia, mas sabiam que Yin e Yang geram movimentos espiralados e infinitos causando possibilidades sem fim e, portanto, seu modo de vida poderia progredir tanto individualmente como socialmente para um estado superior, para O Supremo. Não tinham propósitos de criar instituições e seguidores fanáticos por aquela filosofia, e sim apenas simplificar as religiões e unificar todos os princípios num modo prático, simples e qualificado de se viver, acompanhando a energia fluida da natureza e do cosmos.

No entanto, como as religiões no ocidente tiveram seu auge e logo depois se perderam com o dogmatismo e o autoritarismo, na China o Tai Chi também teve este destino. Muitos começaram a confundir e interpretar mal os princípios Yin e Yang, e construiu-se a idéia de que o poder Yang estaria naqueles com mais força e agressividade, e o Yin naqueles mais passivos, bondosos e simples, sendo tachados como fracos. Por isso o poder máximo, ou o imperador, deveria ser aquele mais violento e autoritário, e a mulher ou os mais débeis (Yin) eram ensinados a serem fracos e submissos e muitas vezes escravizados. Isso criou uma idéia falsa do Tai Chi naquela época e por séculos a China viveu na obscuridade do autoritarismo. Por sorte poucos sábios e dedicados viveram afastados dessa sociedade, preservando e repassando os verdadeiros princípios do Tai Chi de geração a geração de forma integra e hermética. Assim sobreviveu por séculos até os dias atuais, sendo ainda possível acessar, desenvolver e ensinar seus princípios originais de forma mais aberta e abrangente.

Sinteticamente o Tai Chi tem como objetivo o autoconhecimento e o desenvolvimento das capacidades humanas e supra-humanas, e isso se reflete na comunicação com a sociedade, o planeta e o cosmos. Podemos dizer que é a busca do religare, ou seja, voltar a ligar com a parte divina de si mesmo, ou com deus. É fundamental entender a relação que Tai Chi possui com as religiões já que todas elas possuem esse mesmo propósito que é o religar, para uma vida melhor e mais plena. Hoje no ocidente a religião se mistificou, e por isso é dogmatizada ou totalmente ignorada. Mas temos ainda algumas vantagens como, por exemplo, a busca de se comprovar cientificamente os aspectos religiosos, e isso muitas vezes leva as pessoas a serem livres para experimentar conhecimentos diferentes se livrando de amarras. Afinal, independente de religião, todas as pessoas buscam formas de melhorar sua vida e serem felizes. E o Tai Chi, como sendo um princípio que conserva seus sistemas de prática como experiência desta verdade, enquadra-se nessas vantagens desde que foi trazido para o ocidente. Aqueles que buscam o fazem como um meio alternativo para a harmonização com deus, ou para a saúde física e psicológica, ou também pelo aspecto marcial que ele possui. Porém é ainda um meio pouco conhecido por aqui, mas que gradativamente está sendo assimilado pelos ocidentais, assim como toda cultura oriental que conserva seus princípios originais. É bom saber disso, pois na China, infelizmente, apesar de não haver mais o autoritarismo agressivo do governo como havia séculos atrás, o Tai Chi está na mesma situação que a Religião está hoje aqui no ocidente, visto como um dogma ou ignorado completamente.

Podemos ser gratos aos poucos buscadores, sábios e estudantes do Tai Chi que conservaram seus princípios ocultamente por humildes e pequenas, mas grandiosas obras. Livres pensadores que permitiram a filosofia e a prática chegarem intactas e aperfeiçoadas em nossos dias. Assim como tantos outros iluminados, santos e alquimistas de outras culturas que trabalharam e ainda o fazem em prol deste esquema de proteção do conhecimento supremo, mesmo que as cascas institucionais tenham sido corrompidas, mas que por trás das linhas podemos perceber o objetivo comum que todas as correntes filosóficas e científicas do mundo possuem: o religare, o supremo.  

terça-feira, 29 de março de 2011

Ong-Bak - Resenha

Ong Bak, luta, sangue, mais sangue e mais luta. O que muitos disseram ou pensaram a respeito desta produção de longa metragem? Aos olhos de alguns pode ser muito trágico, desrespeitoso, sangrento. Aos olhos de outros pode ser diversão e inspiração para lutar, bater, quebrar e fazer sangrar. Mas o que são os olhos dos “alguns” e dos “outros”? Olhos que deveriam ser janelas da alma e não da mente básica e supérflua. Olhos incapazes de sentir as pulsadas do coração. Corpo incapaz de perceber a essência da informação e sentir a força do espírito. Mente presa em conceitos que formula críticas sem ter sequer olhado para os lados.  Mas não tiramos a razão: o filme é mesmo um tanto violento!

Violência e sangue. Mas quem disse que precisamos ver por este ângulo? Olhar pode ser diferente de ver. Ong Bak 2 traz o início de uma trama que continua em Ong Bak 3. O primeiro filme, Ong Bak, pouco ou nada se relaciona com os dois últimos.

A arte das armas e as artes marciais tomam conta da estória, e o personagem Tien domina muito bem suas técnicas e sua força. Os anciões já previam seu poder e sua capacidade, no momento quase único, para lutar contra o império traidor e cruel que pretendia dominar a Tailândia, e assim restaurar a paz. Tien era órfão de pais assassinados pela crueldade do poder imperial. Aprendeu a arte das guerras para lutar se fosse para trazer de volta a paz, mas a dor que sentia pela sua perda lhe trouxe ódio e uma sede insaciável de vingança. Foi atrás de seu desejo, lutou e matou, mas no final seu poder não foi o suficiente para derrubar todos os soldados imperiais. Foi preso e torturado, a sede de vingança se voltou para si mesmo.

Por fim, na continuação que se fez em Ong Bak 3, Tien é salvo de sua pena de morte e com seu corpo todo machucado, já sem condições de vida, carregava ainda sua missão para cumprir. Ele foi curado por uma medicina milenar poderosa, sua alma retornou ao corpo, e ainda sem o controle de seus movimentos e com muitas angústias, revoltas e arrependimentos recorreu à meditação por instrução de seu mestre. Finalmente recuperou o controle sobre si, conquistou o controle de sua mente e atingiu a iluminação através da meditação e a arte das danças que aprendeu quando jovem. Dançou com sua companheira, parceira e amiga desde pequenos, sua sacerdotisa, e entrelaçaram-se na magia da dança.

O amor, a consciência e a sensualidade estão em tudo; essa é a magia sexual, a magia da vida.

Consciente de suas fraquezas decidiu treinar, treinar e treinar por conselho de seu mestre para não cair novamente por suas debilidades: cobiça, inveja, ira, orgulho, vingança, desejos, etc.. Deixou a barba crescer, purificou-se por meio das águas.

Enfim recebeu o báculo no qual em sua ponta possuía uma serpente coroada.

O primeiro grande passo de sua missão foi cumprida.

Contudo Tien vê seu povo sendo destruído e levado à escravidão. Eliminou facilmente muitos soldados que o atacaram; pelas suas veias percorria seu poder. Era o último teste. O império traidor havia sido tomado pelas trevas liderado por um poderoso demônio, aquele que destruiu todos pela sua maldição. Agora era tudo mais que cruel e impiedoso: era extremamente escuridão, penumbra aos olhos dos inocentes. Tien chegou com uma luz guiando seu corpo, o sol foi tapado com a lua e as sombras tornaram-se uma só. Tien fechou os olhos e previu o que aconteceria se tomasse o rumo do destino: lutaria com o exército de mil homens e no final seria atingido pela lança do demônio, depois de ter visto sua sacerdotisa ser degolada. Abriu os olhos e então já sabia o que fazer. Percebeu que tinha o poder em suas mãos de mudar esse destino. Manteve seu olhar sereno e deixou que a lua se movesse e assim o sol iluminou ainda mais forte. Não lutou contra nenhum soldado, todos arderam com a luz e o demônio perdeu suas forças. Na luta com este, Tien obteve sua última prova. Mostrou sua força e seu poder e o demônio não foi problema para ele, nem sequer forçou. Sua vontade permaneceu intacta e não vacilou, a não ser por um breve momento, mas que logo voltara ao foco. O demônio havia sido derrotado, e o povo libertado.

Tien finalmete pôde dançar sua arte, com seu báculo, sua luz e sua paz. Já havia conquistado a Verdade, já não precisava lutar.      

Ong Back 2 e 3 são filmes muito esotéricos. Seus simbolismos revelam o ensinamento universal de aplicação individual e gradual, assim como tudo o é. Tien tinha sede de conhecimento e poder. Porém sua consciência foi tomada pelo seu ódio e sede de vingança. Por isso caiu e não remediou seu Karma que o levou ao sofrimento.

Por sorte vemos a luz imanifestada emitida pelas mentes e corações puros deste Universo, que expandem seu Amor, assim como pelas esperanças das partes autoconscientes de seu Ser. A consciência, o juízo, os apóstolos, o guru, rogam pela sua resistência.

Tien dá a volta, renasce, retoma seu controle, atinge a iluminação e se purifica. Sua purificação foi por meio das águas, as águas da vida, a semente, a força sexual transmutada, castidade científica. A barba e cabelos crescidos simbolizam o cristo; o báculo serpentino a maestria com sua força elétrica desperta. Da sabedoria ao poder, do poder a paz. O demônio é ele mesmo, o ego. Os soldados todas suas impurezas, seus defeitos, suas fragmentações. O cristo vence o ego, traz a luz e o equilíbrio. Tudo é interno. O poder sobre seu universo particular e completo, o Ser.

Concluindo, considero Ong Bak 2 e Ong Bak 3 recomendáveis. Pois apesar de possuírem luta e sangue, demonstram em sua essência os verdadeiros princípios das artes marciais e um ensinamento que percorre os milênios e que muitos vêm conquistando: a cura interior em nome da paz e felicidade plenas. Portanto apesar dos inconvenientes, transformemos as impressões vendo o lado positivo e essencial para captarmos o segredo. Deixemos os conceitos e preconceitos, esvaziemos a xícara, olhemos com o coração. A luz está em tudo, até mesmo por trás das sombras. Como o próprio filme esclarece: sem a luz a sombra não existe, e sem a sombra não há porque a luz existir. No entanto, até para isto existe uma transcendência.

O verdadeiro mestre reside no interior de si. Busque-o!